O São João, é um fenômeno incrível! É plural, colorido, alegre e profissional. Mas, olha só, as questões de gênero que surgem em todos os contextos sociais também emergem nos festejos juninos, nesse espaço não seria diferente. Entendendo que os nossos comportamentos, forma de pensar e agir são frutos da aprendizagem social, como já diria Nelson Mandela “Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar.” Como humana, comunicadora, amante do movimento junino e psicóloga, tenho o dever de levar a educação, desconstrução e transformação adiante, disseminando o conhecimento e quebrando os paradigmas. Bora nessa!
Lá em 2010, meus amigos, os grupos no RN perdiam pontos porque tinham “travestis dançando”. Mas com o passar dos anos e o aumento do acesso à informação, instrumentos legais e normativos, as federações e organizações de festivais começaram a “entender” importância de incluir todes. Surgiram então os festivais de “Rainha G”, que são aqueles em que pessoas do sexo biológico masculino, se travestem para participar dessa modalidade de concurso.
Com mais visibilidade e acesso às informações, as pessoas começaram a ter conhecimento sobre o que realmente significa ser uma mulher transexual, contudo não inibe o preconceito. De acordo com o Observatório LGBTI+, o Brasil registrou 273 mortes violentas de pessoas em 2022, fazendo com que se reafirme a necessidade de espaços com esse, a importância da informação e da desconstrução contínua de preconceito seja ele como for e onde for.
Te convido agora a fazer um exercício: coloque as mãos na cabeça e se pergunte:
1 – Com qual gênero eu mais me identifico, eu me vejo? (homem, mulher, transsexual ou nenhum?)
2- Leve suas mãos até o seu coração e se pergunte: eu sinto atração por qual gênero?
3 – Leve as suas mãos os seus órgãos genitais, isso diz apenas o seu sexo biológico. Toda via, entretanto, é importante ressaltar que a sexualidade é fluida.
Aqui estamos falando sobre identidade de gênero, certo? Não sobre sexualidade. Essas mulheres nascem com o sexo biológico masculino, mas se sentem, pensam e se identificam como mulheres. Elas iniciam tratamentos estéticos e hormonais para se tornarem fisicamente mulheres, mesmo que internamente já sejam incríveis, fortes e maravilhosas mulheres, logo devem ser reconhecidas pela sociedade como tais.
No São João Potiguar, temos importantes e empoderadoras mulheres transexuais, hoje trago para vocês trecho de uma entrevista realizada com a Andressa Fontana, 30 anos, Técnica de Enfermagem, rainha junina há 12 anos.
Como o São João entrou na sua vida?
“O São João entrou na minha vida desde da minha infância, quando via minhas primas dançando quadrilha lá no interior na cidade de Macau, então me apaixonei por aqueles vestidos lindos, pela Dança e por toda magia mas, jamais imaginaria que ali seria meu refúgio, durante minha transição usei a quadrilha junina como válvula de escape, para passar por todos os preconceitos que uma mulher trans vive na sociedade mas, infelizmente durante esse processo encontrei também dificuldades no próprio mundo junino de me aceitarem como a mulher que eu era e sempre soube que fui. Então só em 2012 com a vinda de Alexandre Ninho para o grupo Junina Oxente de Macau, foi permitido que as meninas transexuais dançassem de acordo com a identidade de gênero. Ninho me fez o convite de assumir a responsabilidade de ser a rainha da Junina Oxente e desde então tenho esse cargo comigo em outros grupos juninas como: Explosão Potiguar, Filhos do Nordeste e agora Brejo de Ouro.”
Como surgiu a oportunidade de ser uma mulher trans nos festejos juninos?
“Na minha concepção o que evoluiu foi aceitação do público e de alguns festivais, afinal temos que ser julgadas pela artista que somos e não por nossa identidade de gênero orientação sexual.”
Quais foram as principais dificuldades?
“Ainda hoje enfrentamos dificuldades, principalmente no que se diz respeito nas categorias individuais como melhor rainha, que ainda há muita rejeição de dar o título as mulheres transexuais mesmo que mereçam.”
Inicialmente os termos usados no São João eram:
“As travas”, “Rainha G”. Hoje é usado, “mulher trans”, para você o que isso representa?
“Os termos usadas hoje realmente representa quem verdadeiramente somos, mulheres trans ou simplesmente mulheres!”
O que você acha que falta no meio junino para valorização e reconhecimento em termos de igualdade?
“Bom, o que falta mesmo é capacitação técnica aos jurados, para que possamos ser julgadas de forma igualitária, é o respeito, empatia pela história e trajetória de cada uma de nós cada um de nós, travamos verdadeiras batalhas para chegar onde chegamos e isso deve ser respeitado!”
O que você gostaria de deixar como mensagem para as irmãs que lutam pela mesma causa?
“E o meu recado é para todo o meu mundo junino é: quadrilha junina é arte, cultura viva do povo, que também deve ser para o acolhimento daqueles vulneráveis, que tanto a sociedade discrimina. Nós como associações culturais, devemos acolher sempre e nunca descriminar. O acolhimento é o melhor caminho para formar cidadãos de bem!”
28 de Junho dia do Orgulho lgbtqia+
“Consideramos justa toda forma de amor” – Lulu Santos
1 comentário
obrigada pelo espaço que é de suma importância para nós pessoas transexuais, obrigada ✊🏽🏳️⚧️